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sexta-feira, 5 de março de 2010

Acidente

Subo em minha motocicleta e sob o céu azul,
acelero meu sorriso e minha alegria.
Subo em meu cavalo bravo e poderoso sob minhas rédeas.
Suas respostas são ágeis e seu galope é infinito. 
"Ó Glorioso São Jorge, sobre o seu cavalo, em nome de Deus,
estendei o vosso escudo e vossas poderosas armas,
defendendo-me com vossa força e grandeza."
Meu capacete não prende os meus pensamentos.
Minha esperança é sorver a luz e os mistérios.
Meu medo é não poder sorrir.
O asfalto passa rápido sob meu cavalo corredor.
"Ó São Jorge, meu Santo Guerreiro,
invencível na fé em Deus,
que trazeis em vosso rosto a esperança e confiança,
abre meus caminhos."
Engesso meus sonhos e dou perdão ao meu sarcasmo...
O perdão é um ato de inteligência, mas só se compreende a loucura com o absurdo.
Me concentro em meu caminho.
Minha viagem em minha motocicleta me dá muito prazer.
Mas semelhante atrai semelhante...
Alguém mais atrevido e veloz, em sua pequena motocicleta, segue em direção oposta...
"Eu andarei vestido e armado com vossas armas
para que meus inimigos tendo pés não me alcancem,
tendo mãos não me peguem,
tendo olhos não me enxerguem
e nem pensamentos possam ter para me fazerem mal."
Nunca tive medo do vento, mas não acelero a incerteza e nem forço o motor.
O dia está claro, quente e propício.
Sob o capacete, meus pensamentos são bons...
Meu silêncio faz a segunda voz para o barulho do motor.
Se sigo livre é porque sei cantar.
Os sinais de trânsito são claros e os semáforos tricolores comandam a todos no ir e vir.
"Armas de fogo o meu corpo não alcançarão,
facas e lanças se quebrarão sem ao meu corpo chegar,
cordas e correntes se arrebentarão sem o meu corpo amarrar."
Derrepente, apagam-se todas as minhas memórias, toda uma vida...
Sinto cheiro de velas...
Dói o corpo, as pernas, o pé!
Alguém mais atrevido e veloz, em sua pequena motocicleta,
desrespeitou uma das três cores do semáforo comandante,
desrespeitou sua própria vida, desrespeitou a minha vida,
me fez calar, mas não emudeceu a minha fé:
"Glorioso São Jorge, em nome de Deus,
estendei vosso escudo e vossas poderosas armas,
defendendo-me com vossa força e grandeza.
Ajudai-me e ao meu veloz desconhecido, a superar toda dor.
Dai-me coragem e esperança,
fortalecei minha fé
e auxiliai-nos agora e sempre."
Estamos deitados sobre o asfalto quente.
Muitas pessoas se aproximam.
Os automóveis passam rentes as nossas cabeças.
Meu capacete não me abandonou.
Sinto sua presença e seu calor.
Meu cavalo jaz deitado, chorando gasolina,
mas imponente e quase sem ferimentos.
Aquele alguém mais atrevido e veloz e sua pequena motocicleta,
já estão perdoados.
Danos de boa monta em seu pequeno cavalo.
Danos morais e materiais em nossa carne e ossos...
"Ó Glorioso São Jorge, estendei vosso escudo e fortalecei minha fé."
Há sangue sobre o asfalto.
Mas não me ausentei da vida.
Não me ausentarei dos sonhos.
O gesso sobre o meu corpo não imobiliza minha mente.
A dor dói se o coração consente. 
"Ó Glorioso São Jorge, que em nome de Deus,
estendestes vosso escudo, 
defendendo-nos com vossa força e grandeza, 
obrigado!".
O silêncio foi rompido, uma nova chance e um novo rolar de dados...
Os caminhos foram reabertos e o meu cavalo me aguarda,
para montá-lo mais uma vez...
Talvez se passarão alguns dias, ou meses.
Nunca cessei meus sorrisos e
agora voltarei a cavalgar contra o vento,
contra a correnteza, mas não contra a sorte.
Não te enciumes destas muletas,
meu velho e bom cavalo.
Voltarei a montá-lo em breve. 
 "Ó São Jorge, meu Santo Guerreiro,
invencível na fé em Deus,
que trazeis em vosso rosto a esperança e confiança,
obrigado por cuidar dos meus caminhos,
e daqueles que o cruzam!
Amém!"